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Sarasvati

Editorial 2009 - Janeiro 

Gloria Arieira

Que Sarada (sara = a ignorância; da = aquela que destrói; Sarada é Aquela que destrói a ignorância), que é Sarasvati, esteja sempre conosco (o professor e o aluno). Que Ela que está sempre em sat, a verdade, que tem a face agradável e bela como o lótus no outono, esteja sempre em nossas faces de lótus, i.e., a nossa fala e nosso intelecto.

 

Na visão dos Vedas todo o universo é a manifestação de Brahman que é Consciência; isto significa que o universo é uma superimposição ou superposição em Brahman.

Existe somente uma realidade, ekam sat, que é vista de várias maneiras com diferentes formas e nomes, e assim o indivíduo pode se relacionar com ela. A variedade refere-se aos diferentes aspectos da manifestação da realidade, Ishvara.

Se entendemos Ishvara, entendemos nossa identidade com Ele e portanto nossa natureza livre de limitação. Se não entendemos Ishvara e nossa conexão com Ele, criamos o samsara, fazemos da manifestação do universo uma vida de limitação e aprisionamento, que é o samsara.

Para conhecer a realidade que é Ishvara temos que reconhecer que o universo não é separado dele e ao nos relacionarmos com o universo estamos nos relacionando com Ishvara. Ao mesmo tempo, a dualidade na forma do indivíduo, de Ishvara e do universo, é mera aparência.

Para nos ajudar a compreender esse mistério da realidade única imutável que é ao mesmo tempo a causa do universo e o próprio universo, pedimos ajuda a Ishvara na forma de Sarasvati através deste verso-oração acima: que Ela nos ajude a entender a realidade e permanecer na verdade em ações, pensamentos e palavras.

Para adquirir o conhecimento de Vedanta que é a revelação da natureza do sujeito livre de qualquer limitação, é necessário possuir a mente focada no autoconhecimento e na liberação. Porém, a mente é mutável, agitada, com muitos gostos e aversões e seus padrões já adquiridos nas experiências dos prazeres dos sentidos e nas descrições de tantos outros prazeres ainda por serem experienciados. Desenvolvemos apego a alguns objetos, aversões a outros; assim somos invadidos por ambos e cresce a agitação da mente.

Os gostos e aversões impregnam a mente e iludem o intelecto; assuntos que não têm relevância tornam-se importantes.

A mente se ocupa com o passado e o futuro que só têm realidade oferecida pela própria mente de cada um.

A projeção do futuro e a memória do passado, junto com as emoções reativas como o medo, a raiva, a mágoa e a culpa, ocupam a mente e assim o conhecimento do Atman não tem espaço.

Lidar com as dificuldades da mente, tais como a agitação e a ausência de concentração, é o chamado processo de purificação da mente, sattva-shuddhi nas Upanishads. A mente precisa estar sutil, sattva, para poder ir além de seus aprisionamentos e perceber o Atman além da dualidade. 

Livre de vasanas, os padrões mentais relacionados aos gostos e aversões, a mente consegue focar no Atman e entender a identidade do eu com Ishvara, conforme o ensinamento dos shastras, os textos que revelam e desdobram esse conhecimento.

O preparo para usufruir o conhecimento de Vedanta depende da bênção de Sarasvati, por isso começamos 2009 com uma oração a Ela.

 

Om tat sat 

Editorial 2009-Maio

Gloria Arieira

Na tradição dos Vedas existem rituais chamados samskaaras.

Estes ocorrem em momentos importantes de crescimento, transformação ou maturidade no decorrer da vida de uma pessoa.

Estes momentos são ritualizados com símbolos e significados que ajudam a promover o crescimento, desde o nascimento até a morte, no ritual final de cremação.

Samskaara significa purificação, cerimônias através das quais a pessoa é purificada para enfrentar uma nova etapa da sua vida. Purificação no sentido de tornar algo ou alguém capacitado para alguma coisa.

Através de um ritual objetiva-se agregar novas qualificações à pessoa para que possa enfrentar esta nova etapa de vida. Além de associar a pessoa a um grupo ou comunidade ao qual ela passa a pertencer e se identificar.

Sua vida ganha significado dentro de uma ordem maior que é o objetivo universal da vida humana. Através do ritual, corpo e mente passam por um processo de transformação relacionado a etapas da vida humana, com relação ao questionamento e entendimento dos objetivos da vida e à identificação com outros, oferecendo uma dimensão transcendental à sua vida.

O ritual ajuda, então, no crescimento emocional da pessoa e sua plena expressão.

Os samskaaras são muitos e variados dentro da tradição védica, mas podem ser divididos em aqueles relacionados ao nascimento, à infância, à educação, ao casamento e ao ritual funerário, portanto cinco classificações.

Os samskaaras estão relacionados às quatro etapas da vida ou aashramas; a etapa de estudante, de casado, de aposentado e de renunciante. Lembrando que o objetivo da vida na tradição védica é alcançar a maturidade emocional e espiritual para desejar, buscar e alcançar a felicidade plena através do autoconhecimento, o conhecimento da natureza eterna e livre de limitação do indivíduo e de Deus. 

Entre todos os samskaaras, o mais importante e comum na vida de uma pessoa é o vivaaha ou casamento.

Como em qualquer etapa nova na vida de alguém, é necessário que a pessoa tenha apoio e compreensão dos outros ao seu redor, tenha um início harmônico, na presença de pessoas queridas que estão ali para desejar felicidade e sucesso, e como que impingir êxito à nova e desconhecida etapa da vida.

Esta é a relevância de um ritual de passagem, de purificação ou samskaara, em especial do ritual de casamento. Uma vez que de todos os samskaaras, vivaaha, o casamento é considerado o mais importante, pois espera-se que todas as pessoas se casem e vivam uma vida de casado. A convivência estreita e diária entre o casal é também vista como uma oportunidade para uma vida de karmayoga onde a pessoa está consciente de suas ações e reações de forma a aprender a ser o mais objetivo e deliberado possível.

Em termos dos Vedas, é a presença da esposa, patni, que qualifica o marido, pati, a realizar rituais védicos de fogo e a fazer doações.

O casamento é assim uma união não somente física mas de valor espiritual e religiosos, além de uma grande oportunidade para a maturidade emocional do indivíduo.

Depois da primeira infância e da etapa de estudante, onde a criança e o jovem estão protegidos pelos pais e mais velhos e buscam adquirir qualificações, atenções e ganhos para si mesmos, através do casamento, a união entre duas pessoas diferentes, cada um terá a oportunidade e incentivo para desenvolver autosacrifício e atenção ao bem-estar do outro.

A cerimônia de casamento é um evento social festivo que une duas pessoas e suas famílias para a continuidade e fortalecimento de ambas as famílias na geração de filhos. Como é um novo e importante momento na vida de um casal, e requer maturidade de ambas as partes, as famílias e amigos se unem para desejar e invocar felicidade e sucesso aos noivos. Socialmente é uma grande ocasião para festa.

Para a celebração do casamento, a casa da noiva, do noivo e o lugar onde será a cerimônia são decorados. A noiva é purificada com água dos rios sagrados, embelezada com roupas novas, jóias várias e henna nas mãos e pés e para cada um desses momentos há uma pequena ritualística.

Os parentes vêm de longe, convivem alegremente e o ar fica festivo, alegre. Esses pequenos rituais são simbólicos, como a água purificadora, e a cerimônia de casamento é repleta de símbolos, além de mantras védicos que dão a conotação religiosa à união do casal.

Na cerimônia de casamento há a união das mãos direitas dos noivos, o tocar os corações, a noiva subir numa pedra com a ajuda do noivo, as roupas de ambos amarradas uma a outra, o colar amarrado no pescoço da noiva pelo noivo, os primeiros passos significativos dados juntos, como um casal, tendo o fogo como testemunha.

Vários símbolos são usados na tradição védica, Sanatana Dharma, para invocar a auspiciosidade e também para eliminar mau-olhado e inveja, como o sinal vermelho na testa da noiva, o banho ritualístico com mantras antes da cerimônia. Com esses objetivos pede-se aos convidados que abençoem e desejem o bem aos noivos.

Antes da cerimônia ter início, o pai da noiva faz a maior doação de sua vida, doa sua filha ao rapaz que será seu marido e a protegerá e estará doravante a seu lado.

Apesar de haver diferenças na cerimônia de casamento nas várias regiões e grupos sociais da Índia, basicamente são iguais e com os mesmo versos védicos.

No final, pede-se à noiva que olhe para o sol e/ou para a estrela Arundhati (a estrela polar) que faz parte da constelação Saptarshi, para que o casal seja tão firme e constante quanto a estrela.

Fazia parte da cerimônia o casal dormir na mesma cama abstendo-se da relação sexual por três noites consecutivas após o casamento, aprendendo que a vida sexual não é o mais importante no casamento, mas a maturidade a ser alcançada por ambos, a capacidade de um ocupar-se do outro e de seus desejos e necessidades, e para isso o autosacrifício é importante.

Hoje em dia isso não acontece, mas as festividades do casamento duram pelo menos três dias e os noivos só vão juntos para casa, apesar de já estarem legalmente casados, no final de todas as cerimônias.

Antigamente, o fogo que foi aceso e reverenciado no casamento é levado para a casa dos noivos que o mantém aceso ritualisticamente até o fim de sua vida de casados (até que um dos dois morra).

O casamento nos Vedas não tem um objetivo em si mesmo, mas a aquisição da liberação, o objetivo maior da vida humana; além, naturalmente, de dar continuidade à família, tendo filhos. É por isso que a vida do casal é uma vida de yoga para antahkarana-shuddhi, a maturidade, e por fim moksha, a libertação final.

 

Om tat sat 
                                     

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