Uma Semana
- Abraham B Sicsu

- há 4 dias
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por Abraham B Sicsú
Semana de Vedanta 2023
Todo ano acontece. Desde 2006. A pandemia fez parar três anos. Este ano retornou. A Semana de Vedanta reúne estudiosos e seus discípulos para uma reflexão sobre ensinamentos dos textos filosóficos milenares indianos. Nesta, mais de cem participantes absorvendo os conhecimentos dos Mestres que nos orientavam.

Interior de São Paulo. Tremenbé. Uma fazenda que já foi de monges franceses, onde se plantava café e hoje o gado de raça se faz presente. Paisagens lindíssimas, atendimento maravilhoso, muita cortesia, um hotel de campo. Maristela é o nome.
Entre agosto e setembro, o centro Vidya Mandir, sob a coordenação da mestra Gloria Arieira, se prepara para receber os discípulos e professores do país inteiro, a cada ano. Até do exterior se fazem presentes pessoas sequiosas para aprender e trocar experiências.
A estrutura da semana é sempre a mesma. Começa no almoço de segunda e termina nessa refeição ao sábado. Os dias têm uma programação intensa, bem definida, que sempre é cumprida com alegria.
No amanhecer, o cântico do despertar. Sempre me emociono com o grupo em uníssono entoando a canção. Uma meditação comandada por um mestre, em geral com temas correlatos ao da semana presente. Uma prática de yoga ou similar. Faz muitos anos que pratico, na Semana, Lian Gong, pratica chinesa de ginástica, orientado por uma querida amiga.
O café da manhã é fantástico. A comida da semana é vegetariana. Queijos frescos, coalhadas, granolas, pães variados, muita fruta, tapioca, crepes, geleias, tudo da melhor qualidade. Sucos, cafés e chás variados, acompanham.
Um descanso e a aula da Mestra irá começar. São 10 da manhã. A cada semana um tema escolhido. Neste o significado do “OM”, com a análise detalhada de uma Upanishad como base. Sempre se aprende muito. Dois ensinamentos me marcaram.
Sempre tive muita dificuldade em compreender como o “Eu e o Universo são idênticos”, em que tudo já está no Eu, mesmo que ignoremos. Só se entende isso se tivermos em mente o conceito de Consciência como Ordem. Não é consciência de alguma coisa, mas consciência pura. A aparência não pode ser vista como o absoluto, livre de limitação. Em outras palavras, tentando simplificar, o mundo e suas características, só existem para o indivíduo e para o universo em sua consciência, ela lhe dá concretude, é a partir dela que entendemos os objetos, as ações e mesmo os pensamentos. Ou seja, para um indivíduo, tudo se forma e contorna na busca da compreensão de sua própria consciência. Complicado, mas para mim fez sentido.
Nessa linha, outro ensinamento que me marcou, principalmente no País em que vivemos, foi a diferença de aparência e absoluto. Qualquer objeto, qualquer situação, sempre terá diferentes óticas em que pode ser vista. Nossa visão é sempre parcial e, portanto, permite termos perspectivas bastante diferentes. Não existe a verdade absoluta, enquanto única perspectiva. Respeitar as visões de outrem, os focos que dão, permitiria que avançássemos na busca da totalidade. Negar aprioristicamente, não querer escutar ao menos, nos leva a enraizar um ponto de vista, considerando-o único, confundindo-o com o absoluto. Isso leva ao monólogo e as rupturas sociais, bem parecido com o que é visto nos últimos anos no Brasil.
Após a aula da Mestra, outro professor dá uma aula para aprofundar algum aspecto interessante da cultura em que está inserido o contexto do encontro. Gosto muito das aulas de mitologia védica, seus múltiplos deuses que expõe com clareza os diferentes aspectos da vida humana, este ano aprendemos muito sobre o zodíaco.
Também, lendas milenares com a de Ajurna e Kirshna, ou a de Haruman, trazem ensinamentos que apaziguam a alma e dão caminhos para a vida. Tema para um próximo texto, talvez.
Fim da manhã e uma aula de canto para descontrair. Muito boa, mas prefiro uma caminhada e um banho de piscina.
Após o almoço, breve descanso e a maratona recomeça, às 15 h. Uma atividade prática. Fazer um Deus Ganesha em barro, colocar nossos sonhos em um barquinho que as águas correntes levarão, despojar-se de nossa obra prima em uma lagoa, fazer uma dança circular, cada dia algo para preparar para as novas aulas da tarde e os comentários dos professores. Essas atividades, incluindo as aulas, acabam às 19 h, para a refeição noturna.
Depois da janta, atividades mais descontraídas, uma dança indiana lindíssima, um filme sobre a Índia, outro sobre o Sertão e os costumes brasileiros, música no entorno de uma fogueira para queimar as mazelas e colocar as esperanças vindouras. Tudo apontando para uma noite de descanso e o acordar de madrugada para novo dia de atividades.
Essa semana me fez pensar. Tive tempo para entender um pouco do que é a vida nestes anos de aposentadoria e como quero direcioná-la adiante. Tenho a convicção de minhas dificuldades com o filosofar, com a compreensão de minhas missões na vida, mas a busca é meu caminho. Cada vez com mais convicção.






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