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  • Swami Sadatmananda Saraswati

    Por Henrique Castro Swami Sadatmananda Saraswati nasceu em 22 de setembro de 1962 no estado de Gujarat, Índia. Desde criança se interessava por questionamentos espirituais. Quando tinha dezessete anos encontrou Swami Brahmatmananda, aluno de Pujya Swami Dayananda Saraswati, e lhe apresentou uma dúvida que tinha sobre Īśvara, Deus, a causa do universo. Seria Deus onipresente ou não? O jovem acreditava que possivelmente sim, mas certa organização religiosa que frequentava dissera que não. Swami Brahmatmananda lhe explicou, nesse mesmo dia, como Īśvara, Deus, é onipresente. Isso o impressionou muito e a partir desse dia sua jornada no caminho de Vedānta começou. Ao longo de poucos meses em associação com esse professor, se convenceu de que a vida que ele vivia é a vida que vale a pena ser vivida, e ele se tornou seu exemplo de conduta. Continuando a estudar Vedānta e seguindo as orientações de seu professor se formou em engenharia, trabalhou por cerca de dois anos e então, em 1986, ingressou em um curso de três anos de Vedānta e Sânscrito na cidade de Baroda no ashram conduzido por Swami Brahmatmananda. Depois do curso, foi iniciado como brahmacārī em 1989 e continuou seus estudos no Swami Dayananda Ashram em Rishikesh por três anos com Swami Visharadanandaji. Durante este período, teve o privilégio de estudar com Pujya Swami Dayananda que mais tarde o iniciou como sannyāsī em 1997 dando-lhe o nome de Swami Sadatmananda Saraswati. Sob orientação de Pujya Swami Dayananda, ficou a frente do Arsha Vidya Kendra, um centro de estudo de Vedānta na cidade de Bangalore, de 1994 até 2014. Lá ministrou aulas sobre Upaniṣads, Brahmasūtra, Bhagavadgītā, Purāṇas, sânscrito e diversos textos de Vedānta. Seu amor por estudar o śāstra e compreendê-lo em profundidade é uma qualidade que se tornou notável. Nesse período, devido à sugestão de Pujya Swamiji, compôs um prakaraṇagrantha (texto tradicional) muito especial chamado Sādhanabodhinī, que compila e explica com clareza o ensinamento de Vedānta sobre sādhana, os meios para mokṣa. Assim, muitas pessoas foram beneficiadas com seu ensino e com diversas atividades sociais por ele iniciadas ao longo de 20 anos nesse local. De 2011 a 2013, a convite do Mahamandaleswar de Kailash Ashram, local tradicional de ensino no norte da Índia, ele visitou Rishikesh anualmente e lá ensinou Upaniṣads e outros textos de Vedānta, em hindi com bhāṣya (comentários) e ṭīkā (sub-comentários). Em 2013, Pujya Swami Dayananda sugeriu que ele ministrasse o próximo curso residencial em Anaikatti. Assim, em maio de 2014, sob a orientação de Pujya Swamiji, um curso de três meses seguido de um curso residencial de três anos em Vedānta e Sânscrito foi iniciado no Arsha Vidya Gurukulam, Anaikatti, Coimbatore, com Swami Sadatmananda como professor principal. Quando, em 2015, eu me preparava para ir ao Gurukulam em Anaikatti, com o objetivo de me juntar ao curso de 3 anos, foi estranho pensar que nos próximos meses e anos eu passaria a ter um outro professor de Vedānta que não fosse a minha professora, Gloria Arieira, com quem já estudava há cinco anos. Ainda mais por ser um professor que eu nunca havia visto ou escutado. Mas, chegando lá, bastaram alguns dias de aulas e convívio com Swami Sadatmanandaji para descobrir total śraddhā (confiança) em meu novo professor, pois imensa era sua dedicação em nos ensinar, imensa sua capacidade e conhecimento, e visível era sua ausência de interesse ou necessidade de obter qualquer coisa em troca. Foi um grande alívio e uma grande alegria encontrar alguém que era – além de Pujya Swami Dayanandaji –  como a minha professora no Brasil, firme no conhecimento da realidade absoluta. Seu único interesse era ensinar o conhecimento tradicional de Vedānta, que tem como objetivo mokṣa (liberdade), precisamente da maneira como tinha recebido de seus professores. E a razão de estar lá naquela posição era porque Pujya Swami Dayanandaji, seu professor, havia solicitado. Nesses dias, Pujya Swami Dayanandaji já estava idoso e sua saúde estava muito frágil, portanto, dava apenas algumas aulas e satsangas, e por isso havia apontado o Swami Sadatmanandaji para conduzir o curso como professor principal. Após o mahāsamādhi de Pujya Swamiji em setembro de 2015 a condução do curso e administração do Gurukulam ficaram completamente sob sua responsabilidade. Considero que tive muita sorte de ter me aceito como seu aluno nessa época. Mesmo com todas as responsabilidades de administração do Gurukulam, suas aulas continuaram sempre muito ricas, precisas e leves. Além das várias aulas diárias sobre Upaniṣads e Bhagavad-gītā, tinhamos nos dias de folga um satsanga informal opcional em que alguns poucos alunos nos reuníamos na residencia do Swamiji e tinhamos que responder suas perguntas sobre os tópicos estudados na última semana. Com esses satsangas informais nos divertimos e também aprendemos muito sobre o śāstra. Aprendemos com Swamiji a importância de se estar aberto a ser corrigido pelo professor. Com suas bençãos, os alunos puderam concluir o curso com sucesso. Com sua maneira especial de ensinar, não apenas a visão de Vedānta foi revelada em nossos corações, mas aprendemos a estudar o śāstra, a ler o śāṇkara-bhāṣyam e a pensar como vedāntins de tal maneira a podermos mais tarde seguir nosso próprio caminho na assimilação do conhecimento. O objetivo é que no final do curso os alunos possam estar livres, independentes. Não há nenhuma expectativa da parte do Gurukulam. Isso é algo único e precioso. Atualmente Swami Sadatmanandaji continua exercendo o papel de professor principal no Arsha Vidya Gurukulam, Anaikatti, Índia, que oferece regularmente retiros e também cursos residenciais de longa duração em Vedānta e Sânscrito. Muitos desses seus retiros e aulas estão disponíveis no canal do Youtube (AVG Anaikatti), mas todos em inglês. Com o objetivo de disponibilizar um pouco dessa riqueza para os buscadores que não tem familiaridade com o inglês, foi preparado um vídeo com legendas em português de uma palestra recente de Swami Sadatmanandaji. Nessa palestra são apresentados com clareza vários dos tópicos importantes no estudo de Vedānta assim como alguns obstáculos e desafios que se apresentam ao estudante de Vedānta nos tempos atuais. Que por meio de suas aulas e palestras possamos usufruir e assimilar esse conhecimento sobre nós mesmos que traz a verdadeira liberdade. oṁ śrīgurubhyo namaḥ Link da palestra “A busca do conhecimento como meio para mokṣa”: COMENTÁRIOS BLOG Retornar #vidyamandir #swamiji #swamidayananda #vedanta #gloriaarieira #henriquecastro #saraswati #brahmacari #vedas #upanisads #arshavidyagurukulam #dayananda #gurukulam

  • Dipavali

    A tradição védica é muito antiga, com bem mais de 5.000 anos de existência. É uma tradição de conhecimento e religiosa que oferece vários festivais e dias significativos para que as pessoas possam lembrar e reviver ideias importantes. Uma dessas datas é o chamado Dipavali, conhecido como o Festival das Luzes, mas cujo nome significa uma sequência de lâmpadas. As lâmpadas, que são de óleo com um ou mais pavios, formam desenhos e iluminam as casas, em especial portas e janelas. Nesse dia é comemorada a vitória da luz, da clareza, do conhecimento, sobre a escuridão e a ignorância. É o dia em que chamamos a Devi, em especial Mahalakshmi, para visitar nossa casa, nos abençoar com clareza mental e abundância durante o ano. Comemoram-se várias vitórias, como o retorno de Rama a seu reino, Ayodhya, após 14 anos de exílio. Rama chega com sua esposa, Sita, e seu irmão, Lakshmana, e o reino está todo iluminado com lâmpadas de óleo a jogar luz no caminho de Rama e a dar as boas-vindas aos três. É a ordem da justiça que entra depois de anos de sacrifício, perdas e sofrimentos. Esse dia é de celebração, dia em que honramos a Luz, o conhecimento que dissipa a escuridão e a ilusão. Faz parte desse dia de celebração, cantos, doces, alegrias e votos de felicidades. As casas são lavadas e pintadas; as portas, janelas e os corações de todos são abertos e iluminados, a chamar Mahalakshmi que entre e traga suas bênçãos. Em 2021, esse dia de celebração, Dipavali, será domingo dia 14 de novembro. É interessante notar que Dipavali é perto do festival Hanukkah, o festival das luzes da tradição judaica (que será de 28.11 a 6.12.2021; também um festival móvel) e do Natal cristão (em 24.12). Nesse dia de Dipavali, deixe suas lâmpadas e luzes de sua sala acesas e peçam as bênçãos de Mahalakshmi para que a Luz reine. Hari om, Gloria Arieira COMENTÁRIOS BLOG Retornar #Dipavali #festivaldasluzes #Mahalakshmi #Ayodhya #Rama #Sita #Lakshmana

  • Sri Krshna

    Ouça está história na voz da Profª Gloria Arieira No calendário hindu, agosto é o mês em que se comemora o nascimento de Sri Krshna, no oitavo dia da Lua minguante, e este dia é chamado de Krshna-janma-astami. Este festival é comemorado em dois dias, pois é dito que Krshna nasceu à meia-noite. Comemora-se então no dia anterior e no dia seguinte. Krshna nasceu na prisão, em Mathura, onde estavam seus pais – Devaki e Vasudeva, sendo o oitavo filho do casal. Kamsa, irmão de Devaki, aprisionou seu pai e sua irmã com o marido, Vasudeva. Isto porque Kamsa queria ser rei único e para tal fazia o que fosse necessário, eliminando tudo o que aparecesse como obstáculo para seu plano. Devaki era muito amada por seu irmão Kamsa, tanto que foi ele mesmo o cocheiro no dia do seu casamento de Devaki com Vasudeva. Porém, nesse dia, foi dito a Kamsa que a oitava criança nascida do casal o mataria. Enfurecido, ele manda aprisioná-los e mata cada filho do casal assim que nasce. Misteriosamente, quando Krshna nasce, todos os guardas estão a dormir e as portas da cadeia se abrem. Também as correntes que aprisionavam o casal se quebram. Um lindo menino, escuro como a noite, nasce e uma voz é ouvida: Vasudeva, leve essa criança para a casa de seus amigos Nanda e Yashoda. Eles acabaram de ter uma filha. Traga a menina para cá. Ninguém saberá da troca das crianças. Caso contrário, Kamsa matará esse menino que acabou de nascer com o objetivo de restabelecer o Dharma no mundo. Assim, Vasudeva sai da prisão e atravessa o rio Yamuna, cujas águas se abrem dando passagem a ele e a Krshna que foi carregado numa cesta. Ao chegar em Gokula, onde moravam Yashoda e Nanda, ele faz a troca dos bebês e volta para a prisão do palácio. Ao entrar, os guardas acordam e tudo volta ao que era antes. Kamsa escuta o choro do bebê e vem para matá-lo. Quando vê que é uma menina, fica com muita raiva e a atira na parede. A criança parece voar e do céu se escuta uma voz: Kamsa, seu destruidor está vivo em outro lugar. Com uma gargalhada, a criança torna-se um raio de luz e desaparece. Krshna ensina sobre o Dharma, em vários momentos de sua vida, com atos e palavras. Ele é representado como o mestre de Arjuna na Bhagavadgita e como aquele que orienta os Pandavas durante toda a vida deles, como podemos apreciar na história do Mahabharata. Krshna é representado soprando uma flauta de onde se manifesta doce música – mostrando que ele é Ishvara que dá vida, dá expressão a todo o universo com beleza e harmonia, como a música, as notas musicais. Nesse dia, Krshna é lembrado e honrado com cantos, Puja e distribuição de doces. OM namo bhagavate vaasudevaaya. OM saudações ao Senhor, filho de Vasudeva, aquele que está em todo lugar e é brilhante pois é a luz da Consciência. OM tat sat Gloria Arieira COMENTÁRIOS BLOG Retornar #Krshna #Vasudeva #Ishvara #Bhagavadgita #Dharma #Arjuna #Mahabharata

  • Yoga Sutras de Patañjali | Gloria Arieira

    por Ricky Toledano Sentando-se em seu tablado, nossa amada professora declarou com uma secura incomum: “Yoga Sutras. Certo. Bem, vamos lá." Sem as preliminares cerimoniosas, o canto das invocações tradicionais, a aula já havia começado de forma bastante surpreendente, antes mesmo de Gloria Arieira abrir abruptamente seu livro e acrescentar: “Mas vocês têm que saber que isso não é Vedanta”. Sua irritação ficava clara pela maneira como virava a página impacientemente com o dedo indicador. Disfarcei um risinho com muito mais eficiência no meio da sala lotada, cheia como nunca tinha visto antes no Vidya Mandir, o instituto que Gloria Arieira criou em 1984 após retornar de seus estudos na Índia com Swami Dayananda Saraswati entre 1974 e 1978. O chão da sala de aula naquela manhã de sábado de 2005 estava completamente ocupado. Os que chegaram mais tarde não tiveram escolha a não ser sentar-se nas poucas cadeiras ou ficar de pé durante o curso que durava a manhã inteira sobre os Yoga Sutras de Patañjali. Ela deve ter ficado furiosa, já que, ainda que suas turmas tivessem crescido em tamanho com o passar dos anos, eu havia concluído o curso do Bhagavadgita e assistido a aulas sobre determinadas Upanishads onde havia apenas cerca de dez pessoas sentadas espaçadamente, de pernas cruzadas, ao redor dela. Porém, sucumbindo à pressão da florescente moda global do yoga, a pedido de alguns de seus alunos mais próximos - professores de yoga que se juntaram ao coro crescente dos muitos aspirantes a yogis para entender o manual hermético do obscuro "pai" do yoga - Gloria decidiu dar uma aula sobre o texto antigo, relegado para fora do cânone do Vedanta. Então, de repente, a sala foi magicamente ocupada além da capacidade. Por onde haviam andado todos aqueles alunos para ouvir as verdadeiras explicações? O diálogo entre Kṛṣṇa e Arjuna? Entre Nachiketas e a Morte? A maior das canções que diz não apenas qual é o sentido da vida, mas como viver uma vida significativa? Não! Eles queriam os Yoga Sutras. Confesso que eu era um deles, mas já havia estudado o suficiente com Gloria-ji para saber que Patañjali dificilmente teria sido o criador do yoga. Mesmo há 2.000 anos ele havia sido o produto de uma grande e antiga tradição, que Patañjali também deve ter estudado porque - como você descobrirá nas páginas do comentário de Gloria que é meticulosamente dedicado à língua original - seu uso de termos em Sânscrito indica exatamente como ele havia chegado a tais conclusões sobre como uma vida de disciplina deveria ser construída para atingir o mais elevado dos esforços humanos, o autoconhecimento, que é a plenitude. Isso significa que Patañjali não só deixou um legado para seus filhos e gerações futuras sobre o segredo da realização humana, mas também um rastro para o passado, como as gotas de ghee no chão deixadas por um travesso bebê Kṛṣṇa, levando diretamente de volta à fonte de onde ele o havia furtado. Diverti-me com a irritação da minha professora por testemunhar sua emoção autêntica. Eu ri pela solidariedade de saber que todos sofremos decepções quando os resultados de nossas ações, de nosso trabalho, não são necessariamente os desejados, aqueles que tínhamos planejado alcançar. No entanto, como aprendi nas aulas de Gloria, existe a visão por trás de como alguém deve receber os frutos de suas ações. É toda a visão do Yoga que descobri em outro texto, em que o maior dos guerreiros desmorona no campo de batalha na dúvida íntima e na incerteza sobre qual será o resultado de sua ação. Esta história é chamada de Bhagavadgita, a Canção do Senhor, e foi onde desmoronei, rendendo-me para sempre ao conjunto de conhecimentos que vinha aprendendo sob a cuidadosa instrução de Gloria-ji, exatamente ali no Vidya Mandir, onde me encontrei mais uma vez em uma manhã de sábado, mas não inspirado pelos Yoga Sutras: por que alguém estudaria este texto quando existe a Bhagavadgita? Mas, como também aprendemos na Bhagavadgita, nossas decepções são parte de uma história maior que não podemos ver. Concluí que, embora eu nunca tivesse voltado a assistir nenhuma outra aula sobre Yoga Sutras, outras pessoas não compartilhavam da minha opinião - e que Gloria-ji obviamente havia mudado a sua própria. O que havia sido planejado para ser não mais do que uma aula ocasional intensiva sobre um texto tornou-se um curso regular e um dos mais exitosos em Vidya Mandir. Em nossas conversas durante a edição de meu manuscrito, a tradução de sua Bhagavadgita, Gloria-ji revelou seu prazer em ensinar os Yoga Sutras. Eu estava surpreso e tive que confessar o que nunca havia dito a ela: “Gloria-ji, com todo o respeito, eu estava lá, anos atrás, naquela primeira aula de Yoga Sutra ... você estava tão irritada!” Eu ri novamente, lembrando do rosto dela e daquele dedo indicador apontando com uma raiva incomum. “Os Yoga Sutras?” Continuei, sem graça: “São tão áridos! É como ler um manual de usuário. Você lê e não entende nada! Não faz sentido. Além disso, por que ler os Yoga Sutras quando existe a Gita?” Gloria riu - tanto da minha franqueza quanto da minha opinião, eu creio. “O texto cresceu em mim”, ela começou, desdobrando suas reflexões sobre os Yoga Sutras. “Ocorreu-me que o que Sri Patañjali queria nos passar era a importância de termos clareza em relação ao nosso objetivo na vida, bem como paciência, firmeza e perseverança - especialmente se, de fato, o objetivo é alcançar a liberação final, moksha. A vida diária requer rotina, compreensão das emoções e autocontrole, clareza e perseverança. Patañjali nos oferece o segredo da disciplina, de como levar uma vida de Yoga para a libertação do sofrimento. Ele se concentra em uma vida de Yoga para que o conhecimento que é Vedanta possa ser compreendido. Isso ficou claro para mim”. Minha curiosidade se acendeu e li sua tradução e comentário, publicados pela Sextante no Brasil. Não precisei ir além do prefácio para ver o quanto a mensagem de Patañjali a havia inspirado a refletir sobre o que uma existência disciplinada significava para sua vida como mãe, avó e professora no contexto da tradição védica. Também me apaixonei pelos Yoga Sutras: onde sempre achei a forma dos sutras simplista identifiquei a simplicidade, uma concisão perfeita que ressoou, dissipando a cacofonia que muitas vezes pode ser encontrada ao lidar com um mar de palavras como a tradição védica. Para mim, os Yoga Sutras são como as anotações de Patañjali, traduzindo o que ele aprendeu durante a vida ao navegar naquele mar em seus termos mais essenciais. E é nesses termos que a assinatura da dedicação de Gloria-ji ao Sânscrito fez algo sem precedentes. Descompactando as observações pessoais de Patañjali, preenche o contexto védico de onde elas vieram. O leitor pode ver de onde o grande mestre de yoga as tirou e o que ele quis dizer com termos como Ishwara, abhyasa e moksha - bem como o que eles significam para o yogi. Quando sua irritação inicial de repente diminuiu, por ocasião da primeira aula de Yoga Sutras anos atrás, Gloria-ji explicou que - a despeito do texto - ela repassaria os versos exatamente como sempre havia feito, segundo ela um compromisso inabalável com a Tradição. Aquilo significava que os Yoga Sutras seriam explicados “à luz do Vedanta”. Com sua permissão, optei por excluir esta parte do título em inglês, considerando a afirmação um pouco longa e mais perturbadora do que útil para o título do livro em Inglês. No entanto, seu Yoga Sutra se revela exatamente como suas aulas: cada verso é apresentado em sua forma original em Sânscrito, seguido por sua transliteração, depois por sua tradução e finalmente por seu comentário, de modo que a linha - o sutra - do conhecimento que foi transmitido de mestre para discípulo desde tempos imemoriais permanece intacta. Nunca imaginei que aproveitaria a oportunidade para traduzir os Yoga Sutras exatamente da mesma maneira que havia feito com o Bhagavadgita, publicado pela Motilal Banarsidas (MLBD). Foi uma grande honra para mim, assim como foi uma honra ter o Prefácio escrito pelo Sr. Arvind Pare, um professor que, assim como Gloria, tem um compromisso inabalável com o ensino da Tradição, bem como uma compreensão profunda da íntima conexão entre Yoga e Vedanta - as disciplinas de ação e conhecimento - para a realização humana. Portanto, fico muito feliz em apresentar minhas duas traduções da autora e professora vencedora do prêmio Padma Shri, Gloria Arieira. Abaixo estão todos os links para adquirir nossas publicações. Fique à vontade para visitar o website em Inglês do Instituto Vidya Mandir, de Gloria Arieira. https://amultiplicity.com/author/rickytoledano/ YOGA SUTRAS: · EUA (envio de brochura para todo o mundo e Kindle): https://www.amazon.com/dp/B08PJJLSHT · Brasil (Kindle): https://www.amazon.com.br/dp/B08P817R28 · Índia (Kindle): https://www.amazon.in/dp/B08P817R28 BHAGAVADGITA: · EUA (envio de capa dura e brochura para todo o mundo): https://www.amazon.com/Bhagavadgita-Dialogue-Between-Krsna-Arjuna/dp/8120840127/ref=sr_1_1 · EUA (Kindle): https://www.amazon.com/Bhagavadgita-Dialogue-between-Krishna-Arjuna-ebook/dp/B084KSL1B1/ref=sr_1_3 . India (envio de capa dura e brochura para todo o mundo): https://www.mlbd.in/products/bhagavadgita-the-dialogue-between-sri-krsna-and-arjuna-including-introduction-sanskrit-text-roman-transliteration-english-translation-and-commentaries-gloria-arieira-ricky-toledano-9788120840119-8120840119-9788120840126-8120840127 · Índia (Kindle): https://www.amazon.in/Bhagavadgita-Dialogue-between-Krishna-Arjuna-ebook/dp/B084KSL1B1/ref=sr_1_2 YOGA SUTRAS e BHAGAVADGITA . Vidya Mandir (Livro em meio físico da Bhagavadgita e Yoga Sutras na língua portuguesa): https://www.vidyamandir.org.br/publicacoes COMENTÁRIOS BLOG Retornar #YogaSutrasdePatanjali #YogaSutras #Patañjali #Bhagavadgita #GloriaArieira #RickyToledano #Vedanta #VidyaMandir #Yogi

  • Ganesha e o defeito de visão

    Nos meses ocidentais de agosto-setembro, comemora-se o dia de Ganesha ou Ganapati. Gana significa grupo, seja grupo de pessoas, de animais, de profissionais, grupos de seres vivos. Isha e pati significam senhor, chefe. Assim, gana + isha = ganesa e gana + pati = ganapati – o senhor de todos os seres vivos. Ganesha é aquele que protege a todos. Vi uma vez uma imagem de Ganesha com várias armas que era reverenciada por ladrões, assaltantes. Antes de irem para suas funções, rezavam para que tudo desse certo, o roubo acontecesse e ninguém se ferisse! Ganesha protege a todos os seus devotos! E no mundo todo existem devotos dele, templos para ele ou templos em que ele está presente em lugar de destaque, pois é o eliminador dos obstáculos. Então, antes de qualquer ação, o devoto pede que os obstáculos sejam eliminados e o objetivo da ação seja alcançado. Na Índia, vemos, em especial no Sul, uma forma de Ganesha com 3 olhos, sendo o terceiro entre as sobrancelhas. Ele é chamado de “drshti ganesa” ou “drshti ganapati” e é colocado na entrada de uma casa ou loja, ou no painel de um taxi. Tem como objetivo espantar o que é denominado no Brasil de “mau olhado”, drshti-dosha. E o que é exatamente um drshti? Drshti quer dizer visão, dosha é um defeito. O defeito de uma visão, o olhar que pode causar algum dano ao outro. É um olhar de inveja. Em nossas relações com o universo causamos um impacto e o mundo externo nos causa igualmente um impacto. Este pode ser de apreciação ou repulsa. Quando apreciamos o objeto, ou pessoa, gostando do que é visto, podemos desejar possuí-lo. Este é o olhar de inveja. Apreciar algo e desejá-lo é natural e pode ser uma inspiração para nós. Mas quando vemos o que não temos, podemos nos sentir carentes, inseguros, desvalorizados e desejosos de ter também. É um sentimento natural, mas pode ser exagerado e ficar fora do controle. Inveja é um sentimento que pode ser confundido com ciúmes, porém os dois são diferentes. O ciúme envolve um terceiro fator, uma pessoa que é vista como rival em atenção ou afeto. A pessoa pensa que recebe menos amor ou atenção pois existe outra pessoa, a terceira pessoa, seja em uma relação amorosa, de amigos ou entre irmãos e os pais. O ciúme é triangular e deseja-se ter o outro mais do que a terceira pessoa o possui. A inveja é muito básica, imediata e natural e inclui duas pessoas; é dirigida ao que é visto em outra pessoa – seja uma posse ou qualidade – e é desejado. A inveja, ou o desejo pelo que o outro tem, e eu gostaria de ter, pode produzir uma atitude de hostilidade ao outro; o desejo de que a qualidade saia do outro e venha para mim, e é assim que pode ter uma força de hostilidade ao outro. Em linguagem popular se diz que o desejo pelo que o outro possui, ou seja, a inveja, “seca” a outra pessoa. Esse é o problema, a inveja não carrega só um desejo de ter algo, mas, ao ver esse algo desejável no outro, imagina-se que, para que eu possa ter, o outro terá de deixar de ter, como se saísse do outro e viesse para mim. Com esse pensamento, há internamente uma comparação, uma disputa e uma hostilidade. É tudo isso que a inveja carrega. Não é uma simples inspiração e um desejo, mas o querer exatamente o que o outro tem! A força do desejo da pessoa com inveja pode ser perigosa pois é como se quisesse tirar do outro aquele brilho que é desejado e transferi-lo para si mesmo. A inveja incapacita a pessoa de apreciar a qualidade ou posse do outro; e pode haver o desejo de destruir a pessoa ou a sua qualidade para que então, possuindo aquilo, a inveja que causa mal estar possa desaparecer. O objeto da apreciação e desejo pode se tornar objeto de raiva! Mas tudo carrega uma mensagem, até a inveja; ela pode nos ajudar a entender mais sobre nós mesmos. O que a inveja pode dizer? A inveja fala sobre como a pessoa se sente. Ao ver algo belo, se não é possível apreciar a beleza e ser inspirado por ela, evidencia-se uma insatisfação e carência com relação a si mesmo. A pessoa não consegue somente ver a beleza, mas precisa possui-la pois se sente pequena por não a ter. E ver o vazio em si mesmo irrita, dá raiva, revolta. Mas a comparação com outra pessoa é geralmente injusta pois foca em um aspecto, uma “janela” no outro. E cada um é um todo e não partes isoladas. Cada um terá capacidades e posses especiais que farão a pessoa brilhar e encantar. E, ao mesmo tempo, inevitavelmente, tem outras características que não são apreciadas. Quando se pensa: gostaria de ser como aquela pessoa, ou de ter o que ela tem, se está a olhar para algo em especial, isolado do conjunto. E não se percebe tudo o que custou ou custa para ser assim. O desejo é dirigido ao brilho especial, mas não ao custo que aquilo tem ou teve na vida do outro. E, se esse custo fosse visto, talvez não se estivesse preparado para ele. É verdade que, algumas vezes, o outro já nasce com aquele brilho, mas isso não faz com que um seja superior ao outro, pois ter algo não significa ter tudo. Por isso é injusta qualquer comparação e o desejo de ter ou ser como a outra pessoa. O olhar de inveja, na Índia, é chamado de drshti que numa tradução literal é visão ou olhar. Olhar o outro querendo ser como ele, ter o que ele tem. Tem origem na própria sensação de ser insuficiente e no consequente desejo de ser apreciado e amado como pessoa. Mas o outro poderia ser uma inspiração e não um instrumento para a sensação de menos valia. A inspiração não tem olhar de desejo, mas de apreciação e talvez confiança de que, se a pessoa quiser, poderá também ser aquilo. Cada um é um conjunto de coisas que são apreciadas por si e pelos outros e outras de que não gostamos. E assim será inevitavelmente. O universo é múltiplo em suas formas e possibilidades, a pluralidade em cada um é sua beleza. As expressões variadas pertencem a Ishvara, o todo. Há escolha com relação à ação, karma, que poderá ser, ou não, de acordo com o dharma, uma ação guiada pelos valores universais de falar a verdade, a não violência e respeito ao outro. O fazer pode ser analisado como correto, justo, ou não, dentro de circunstâncias nas quais a ação foi feita. Em relação às características e posses com as quais se nasce, cada um é um conjunto que compõe uma obra de arte única, a obra de arte de Ishvara. Em nosso relacionamento com o universo, podemos apreciar suas belezas, sermos inspirados por elas sem desejar possui-las. Pode haver, ao contrário, o desejo pelo que vemos na forma de inveja. É de se notar que nem sempre desejo é inveja. O desejo pode levar a uma ação pois a pessoa é inspirada pelo que vê no outro. Mas quando, para se ter algo, o outro não é permitido de ter, temos a inveja. Para estar livre de ter inveja, a pessoa precisa ser amiga de si mesma e não olhar para si de forma depreciativa, ser objetiva quanto à pessoa inteira que é. Se faz necessário apreciar as suas próprias qualidades, acolher e aceitar suas limitações e apreciar a beleza do conjunto. Sri Krshna explica, no capítulo 6 da Bhagavadgita, que esse é o tipo de mente do yogi, que consegue meditar e estar em paz consigo mesmo e no mundo. O yogi percebe que sentir medo, desejo, raiva, apego é natural e útil, pois traz a mensagem de como o mundo o está afetando. Cada uma dessas emoções precisa ser olhada dentro de seu contexto sem um julgamento isolado da emoção. E olhando a emoção com objetividade, com um pequeno distanciamento, pode-se entender o que pode ser feito e, a seguir, fazer. É injusto se comparar a uma pessoa num quesito único; cada um é um todo inseparável. Mas existe um possível olhar de julgamento para si mesmo e simultaneamente de desejo por uma característica ou posse do que outra pessoa possa ter. O olhar de desejar o que o outro tem, drshti dosha, é natural, pode acontecer sem que a pessoa se dê conta. Então, drshti ganesa se impõe para neutralizar esse olhar que vem do outro. E como o olhar aparece sem ser convidado, sem marcar hora, drshti ganesa está sempre a postos para impedir que drshti possa chegar até a pessoa que está despreparada para esse tipo de olhar do outro. Mais uma vez, pedimos a proteção de Ganesha. Hari om, Gloria Arieira COMENTÁRIOS BLOG Retornar #Ganesha #Ganapati #obstáculos #drshtiganesa #Ishvara #Bhagavadgita #dharma #SriKrshna #drshti #dosha

  • Swami Dayananda

    Swami Dayananda Saraswati nasceu em uma vila no sul da Índia. Em 1953, morando e trabalhando em Chennai, vem a saber de uma série de palestras ministradas por Swami Chinmayananda, que se torna um de seus mestres, o que transforma sua vida. Dá início, então, ao aprofundamento do seu conhecimento de Vedanta e Sânscrito e em 1962 torna-se um renunciante. No centro, um templo em Manjakuddi onde Swami nasceu. No lado direito, a casa onde Swamiji nasceu e viveu. Começou a ensinar Vedanta e Sânscrito em Rishkesh, no norte da Índia, às margens do rio Ganges, e em 1973 foi chamado por Swami Chinmayananda para ensinar durante dois anos e meio a um grupo de 50 estudantes em Mumbai. Foi o início de vários cursos na Índia e nos Estados Unidos. Seus cursos, também ministrados em Inglês, abriram aos estudantes do Ocidente a oportunidade de acesso a este ensinamento. Swamiji, como é conhecido por seus discípulos, viajou por toda a Índia ministrando cursos e palestras, e desde 1976 foi para os Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Suécia, Austrália, África do Sul, Brasil e Argentina. Em todos esses países, assim como na Índia, era conhecido por sua facilidade de comunicação e pela clareza e profundidade de seu conhecimento de Vedanta e da complexidade humana. A primeira visita de Swamiji ao Brasil data de dezembro de 1978. Desde então, realizou 13 visitas ao nosso país, tendo estado em São Paulo, Recife, Porto Alegre e Campinas, além do Rio de Janeiro. Seus cursos e palestras eram traduzidos para o português pela Professora Gloria Arieira. Rio de Janeiro, Dezembro de 1978 Satsanga em Saylorsburg, EUA, 1990 Em março de 1999, tivemos a oportunidade de conviver com ele em um curso de quatro dias em Itatiaia, sul do Estado do Rio de Janeiro. Sua última visita foi ao Rio de Janeiro, em 2004, onde, com clareza e eloquência fez várias palestras e satsangas para mais de 400 pessoas. Rio de Janeiro, 2004 Swamiji estabeleceu dois ashrams na Índia, um em Rishikesh e outro em Coimbatore, e o Arsha Vidya Gurukulam, nos Estados Unidos. Nessas instituições, Swamiji era o principal professor. Os cursos de Vedanta e Sânscrito tiveram duração de trinta meses, em regime residencial, e o ensinamento é passado de mestre a discípulo, num fluir permanente, que tem como objetivo desdobrar a visão de "eu" como um Ser completo e livre. Recentemente, Swamiji criou um programa para ajudar as pessoas que vivem em áreas distantes dos centros urbanos, na Índia. ​ Este programa oferece uma ajuda nas áreas de saúde, educação, auto-suficiência e validação cultural. Esse movimento chama-se All India Movement for Seva, AIM for Seva, movimento de toda a Índia para o serviço. Ele também conseguiu reunir vários representantes de diferentes sampradayas, as várias tradições de ensinamento da Índia, o programa é chamado de Acharya Sabhá. Na vila em que ele nasceu, Manjakuddi, no estado de Tamil Nadu, foram estabelecidas escolas para crianças de todas as idades e uma universidade que serve várias vilas ao redor de Manjakuddi. A vila foi reformada mantendo o seu formato tradicional. Alunos de Swamiji levam seus alunos para a vila para fazerem camps de estudos de Vedanta e tradição védica, pois foram construídos lugar para abrigar e alimentar as pessoas que vão estudar e uma confortável sala para aulas. É uma experiência única em uma vida muito confortável no sul da India, enriquecida pela presença de Swamiji pois foi ali que ele viveu até seus 20 anos. ​ Manjakuddi, Tamil Nadu Em 2010 Swamiji completou 80 anos. ​ Em 2011 completou 1.000 luas de vida, e um evento comemorativo desta data, chamado de Satabhishekam, aconteceu em Coimbatore, no sul da India, nos dias 20 a 22 de julho de 2011. Foi uma homenagem ao Swamiji e reconhecimento por seus anos de dedicação ao ensinamento de Vedanta, proteção da cultura védica e serviço social através do AIM for Seva. Em 23 de setembro de 2015, Swamiji alcançou mahasamadhi, em seu ashram de Rishikesh, India, à beira de Ganga, num momento de muita paz e quietude. Todos seus alunos e devotos sentem sua presença a permear o universo. ​ Hari om, Gloria Arieira Clique aqui !!! Saiba mais sobre Swami Dayananda, assista palestras, homenagens e fotos. COMENTÁRIOS BLOG Retornar #vidyamandir #swamiji #swamidayananda ​

  • Uma cultura diferente da nossa

    Quando visitamos outro país, levamos conosco nossa bagagem, nosso conhecimento, nossas referências e nossa forma de vida – que incluem os padrões de comportamento nos momentos de ganhos e comemorações e nos de perdas e sofrimentos. São expressões de sentimentos, valores, crenças e hábitos por meio da linguagem, de atos e atitudes que são cultivados e repetidos por gerações. Quando chegamos a um lugar cuja cultura é nova para nós, percebemos a beleza estética do local e podemos ter imenso prazer com alguma coisa que percebemos como diferente e bela presente ali. Mas há algo mais profundo do que a estética, pois há em cada cultura uma mensagem maior que pode não ser captada. A cultura local tem seus valores, suas prioridades e importâncias sociais. Isso não conseguimos ver – pelo menos não numa única visita. E geralmente não lhe damos importância, já que estamos impregnados da nossa própria cultura e do nosso padrão de comportamento, que incluem nossa roupa, nossa linguagem e nossas atitudes. Queremos somente passear e relaxar. É o que acontece quando se visita a Índia. Saindo do mundo ocidental, a pessoa vê muitas coisas lindas e diferentes ao chegar lá. Admira-se, fantasia-se com elas, compra e leva para casa. Uma beleza diferente é apreciada, mas o coração do lugar e de seu povo não é entendido. Para isso a pessoa teria que largar por ora seus próprios conceitos e expectativas, abandonar julgamentos, comparações e exigências e tentar ver o que está à sua frente, sem tudo isso que está preestabelecido em sua mente – o que é muito difícil. Fazemos então uma mescla de nós mesmos e da Índia que estamos a ver. Mas esse encontro é misterioso, pois existem muitas coisas vistas que não são evidentes e que não conseguimos decifrar nem entender assim como são: sua história, seu passado, os obstáculos e as soluções encontradas... Enfim, sua vida construída até aquele momento. Quando o que vemos é muito diferente do que estamos acostumados a ver, não conseguimos decifrá-lo. Assim é que o misterioso não é entendido, mas interpretado segundo padrões estrangeiros e mantido, portanto, desconhecido, oculto. Para olhos ocidentais, muitas coisas são diferentes na Índia. A história indiana não é estudada nas escolas ocidentais, pouco sabemos do que aconteceu por lá. A filosofia antiga estudada em todo o mundo ocidental é a grega, assim como gregos são os filósofos conhecidos. Quando se olha a Índia é sempre em estudo comparado, referenciado e “encaixado” pelo pensar ocidental. Como podemos entender o que dizem e fazem se a referência é sempre estrangeira?! Assim, não há entendimento, mas julgamento ou interpretação. O olhar já está comprometido! Até mesmo quando desejamos ajudar, colaborar, o ponto de referência é estrangeiro, e não o da necessidade local! Que tipo de ajuda é essa que determina o que o outro deve receber e como deve reagir?! Isso acontece quando visitamos a Índia e também quando conhecemos alguém de uma cultura diferente da nossa. A Índia é o berço da cultura dos Vedas. Encontramos indianos de diferentes religiões, todas acolhidas no país, mas a origem das várias religiões, sejam as bíblicas – judaísmo, cristianismo e maometismo –, sejam o parsismo – do Irã –, está fora da Índia. O sikhismo, o budismo e o jainismo, no entanto, nasceram na Índia e têm muitos pontos em comum com os Vedas. A cultura original da Índia é a cultura védica há milhares de anos. O que é mais diferente e singular na Índia, na tradição cultural dos Vedas, é a dedicação milenar exclusiva de famílias à memorização e ao estudo do significado dos Vedas. A cultura e sua preservação estão alicerçadas naqueles que mantêm os Vedas vivos. Os Vedas têm uma visão holística do ser humano, todos os assuntos estão conectados entre si, como o autoconhecimento, a ciência da saúde, a prática de yoga e pranayama, a dança, o teatro, a música, a arquitetura e tantas outras áreas do saber – todas abordadas nos Vedas. Ao redor dos templos sempre existiram comunidades que sustentavam as atividades dos templos, além do estudo rigoroso e ensino dos Vedas. Hoje temos essa prática antiga ainda viva no Sul da Índia. Nas redondezas dos templos, há áreas chamadas Agraharam, onde é possível escutar cantos védicos durante todo o dia, desde bem cedo, quando passamos por ali. Professores e alunos se reúnem para aulas. Perto dos templos podemos encontrar um ambiente de tranquilidade, dedicação e harmonia. Esses professores e alunos cantam os mantras védicos para a paz de toda a humanidade. Se preocupam em preservar a paz em toda a comunidade, em todo o país e no mundo. A alimentação totalmente vegetariana e suas práticas diárias têm foco no respeito e na não violência com qualquer pessoa, animal ou elemento da natureza, contribuindo para a paz e harmonia de todos. Eles se vêm como responsáveis pela tranquilidade e pelo bem-estar de todos; fazem orações e rituais para todos, e não para si e suas famílias exclusivamente. Na proteção ao conhecimento e com o estilo de vida de dedicação a todos, esses professores e alunos preservam o conhecimento que dá estrutura à cultura viva em todo o país há milhares de anos. Quando visitamos o Sul da Índia e vemos um Agraharam, pode nos saltar aos olhos uma aparente e deliberada separação, como se esses estudiosos e cuidadores dos templos fossem arrogantes e tivessem uma atitude de superioridade em relação aos demais. Porém, não é isso. Os Agraharams existem para que esses estudiosos devotados ao divino possam viver uma vida simples dedicada aos estudos e às práticas necessárias para a paz e o bem-estar de todos, para que toda a comunidade possa usufruir de seus cantos, rituais e orações. Enquanto eles dão exemplo e pensam em todos, os outros grupos que compõem a sociedade são inspirados também a contribuírem com suas tarefas. Assim todos podem ser beneficiados, como diz Sri Krishna na Bhagavadgita 3.11: Parasparam bhavayantah sreyah paramavapsyatha. Contribuindo uns para os outros, todos alcançam o bem maior. E quando todos fazem sua parte, seu dharma, todos são abençoados com o bem-estar. Um inspira o outro a cumprir seu papel, pois a manutenção do dharma depende de todos os membros da comunidade. Os estudiosos, cumprindo seu papel com o olhar para toda a comunidade, inspiram todos os outros a também cumprirem com seus devidos papéis. Toda essa complexidade da sociedade indiana pode não ser vista em algumas visitas. O visitante poderá ser levado, por seus próprios preconceitos, a concluir que há injustiça e desorganização social, quando na verdade há uma diferente estruturação social que funciona. Para poder ver o outro e ajudá-lo, se for necessário, se faz essencial que eu possa vê-lo com os olhos dele e possa estar disponível para abrir mão dos meus julgamentos e simplesmente olhar e ver o outro, o diferente. Isso sem deixar que meu olhar seja comprometido e aprisionado. O que é comum a todos os seres humanos em seu mais íntimo são os valores universais, o dharma, mas as expressões humanas são infinitas e todas são válidas e possíveis, desde que haja respeito, sinceridade e não violência. Que cada um de nós possa proteger o dharma e estar preparado para acolher as formas de expressão com surpresa e encantamento pela mera variedade que existe no universo – as formas de Ishvara. Hari om, Gloria Arieira COMENTÁRIOS BLOG Retornar #vidyamandir #diferencacultural #srikrishna #dharma #ishvara #sikhismo #budismo #jainismo

  • Se Deus quiser

    “Se Deus quiser vamos sair dessa”, dizem por aí. E ao estudarem Vedanta, dizem então: “Se Ishvara quiser!” Mas quem é esse Ishvara, afinal? Será o presidente ou o primeiro-ministro? Será alguma autoridade que tudo decide? Mais uma vez temos que dizer: entender Brahman é fácil; difícil mesmo é entender Ishvara. Ele é o criador? Sim! Causa inteligente mas causa material ao mesmo tempo. Não é um deus religioso no qual é obrigatório acreditar. Ishvara tem que ser compreendido, pois só assim poderemos nos relacionar com ele adequadamente. Como se pode, ou se consegue, estabelecer uma relação com alguém que não conhecemos? Se ainda assim houver alguma, será uma relação fantasiosa, fruto de minha imaginação ou confusão – talvez, no máximo, de um conhecimento parcial ou de pura crença. Então, como podemos estabelecer uma relação segura, definitiva e clara? Afinal, sem clareza, não há paz; há dúvida, incertezas e até medo. Qualquer criação tem duas causas – a causa inteligente e a material. Em geral, elas são vistas como elementos separados: há a pessoa que faz o pote e há o barro, o material do pote. A inteligência é responsável pelo objeto criado – por escolher como e para quê criá-lo. O criador, portanto, sabe como criar e tem um plano para a criação, ou seja, tem um propósito. Já o material é sempre obtido em algum lugar. Quando se fala em Ishvara, as duas causas estão no mesmo lugar, como a aranha e sua teia, como o sonhador e seu sonho. O ser inteligente e o material da criação não estão separados. Assim é Ishvara, dizem os Vedas. E há aí uma lógica que podemos seguir e entender. O indivíduo está no universo e tem um corpo, que é limitado por tantos outros. O corpo de Ishvara é todo o universo e, assim, não tem como ser limitado nem competitivo, pois tudo é ele. Ele não tem ego, como o indivíduo tem. Não tem vontade nem faz nada. Então, “Se Ishvara quiser” é uma frase que não tem sentido. Ishvara mantém o universo em funcionamento, mas não por suas escolhas. Sua inteligência está nas leis que o governam – leis da física, da química, da psicologia, que dão conta da natureza do fogo, da água, do ar, da terra, dos corpos celestes, de tudo, enfim. O universo todo está em movimento de acordo com leis que são constantes e infalíveis. As leis são uma expressão da inteligência que é Ishvara. Uma delas é a lei do karma – bela, justa e complexa. Portanto Ishvara não decide se vou adoecer e morrer; nem se vou me curar caso adoeça; tampouco se serei feliz ou não. Ele não decide nada, não faz nada. Tudo funciona num fluxo contínuo de causa e efeito, obedecendo às leis que são a estrutura do universo e que não são inertes, mas inteligentes, pois vemos inteligência, conhecimento, em tudo. É a inteligência que é Ishvara e está presente em toda parte, esperando ser percebida por você. Ao olhar para todos os lados, o que você vê é somente conhecimento que ganha forma – o universo, que é Ishvara, e no qual você está incluído. Ishvara se expressa através de tudo, através de cada ser vivo, como você, que acredita ser separado, que dispõe de um ego, ahamkara, e se considera muitas coisas, em especial separado e diferente de Ishvara. Também pensa que se ele quiser, tudo vai dar certo, e que, se ele não quiser, não vai; ou que ele não existe e a responsabilidade de tudo parece ser sua! Mas o todo, para ser todo, tem que incluir tudo, até você. E tudo está em ordem, pois as leis são infalíveis. Por isso, só resta a cada um viver cada dia que se apresente, pois para o ser humano, ao contrário do que acontece com os animais, existe um tanto de livre-arbítrio. E viver com surpresa e encantamento, da melhor maneira possível, pois viver é fácil e difícil, prazeroso e extenuante, produtor de alegrias e sofrimentos, uma jornada repleta de propósito, mas que por vezes parece não ter propósito. Quando só vejo a mim, isolado de tudo, não consigo relaxar para conseguir ver mais do que uma pequena parte do todo. E uma visão única, parcial e isolada de qualquer coisa é, além de injusta, produtora de sofrimento – ao contrário da visão inclusiva e reconfortante do todo que é Ishvara, daquela visão a partir da qual podemos dizer, entendendo a profundidade do que estamos a dizer: “Vamos ver. Fiz o que pude. Agora está nas mãos de Ishvara, da ordem que é Ishvara.” Om tat sat. Gloria Arieira

  • Aprendendo com a experiência alheia

    O mundo merece conhecer Deepak Ramola. Ele é um jovem indiano de Dehradun, a capital do estado de Uttarkhand, que fica na região chamada Garhwal, aos pés dos Himalayas. Uttarkhand é um estado dividido em duas áreas – Garhwal e Kumaon, que eram dois reinos há muitos anos. Garh significa uma fortaleza e essa região possui de fato muitos fortes. Fazem parte dessa região os templos Kedarnath, Badrinath, Gangotri e Yamunotri. Na área denominada de Kumaon, que dizem ser um nome derivado de Kurma-avatar (a encarnação de Vishnu na forma de tartaruga), estão outras cidades menos conhecidas, mas igualmente belas e incrustadas nos Himalayas; a mais conhecida é Almora. Dehradun tornou-se um local mais conhecido hoje, pois muitas pessoas agora vão de Delhi para Rishikesh de avião através do aeroporto de Dehradun; de lá pegam um taxi e em 40 minutos estão em Rishikesh. A cidade de Dehradun é banhada pelo rio Ganges ao leste e pelo rio Yamuna ao oeste, e é conhecida por seu delicioso arroz basmati. Deepak Ramola nasceu em Dehradun em 18 de novembro de 1993. Desde bem pequeno perguntava para as pessoas que vinha a conhecer “qual é sua lição de vida?” e juntava as respostas das pessoas para posterior reflexão. Buscava entender o aprendizado de uma pessoa como um aprendizado possível para a humanidade. Com apenas 17 anos, Deepak fundou o Projeto FUEL (Foward the Undestanding of Every Life – Fazer seguir o entendimento de todas as vidas). O lema de seu projeto é – “Pessoas que estão muito distantes umas das outras e nunca se encontraram podem se relacionar e se ajudar a dar continuidade às suas vidas meramente através de lições de vida”. Deepak realiza workshops sobre competências para a vida (Life skill workshops) usando várias de suas habilidades, como o teatro, contação de história, escrita criativa, poesia e outras técnicas. Ele contabilizou mais de 50.000 lições de vida e ajudou mais de 60.000 pessoas de idades e classes sociais diferentes através de seus workshops em toda a Índia e outras partes do mundo. Ele acredita que, quando se descobre as similaridades na condição humana, as pessoas conseguem rir juntas quase que instantaneamente. Ele já juntou, e continua a juntar, lições de vida de todo o mundo, a seguir ele as transforma em exercícios interativos e programados para alguma execução artística para que se possa experienciar lições de vida de outras pessoas de forma prática. Como um exercício, ele propõe que se escreva uma carta para si mesmo como se você fosse outra pessoa a falar com você mesmo e, no processo, desenrole sua mente. Ao fazer isso, a pessoa pode reconhecer e tomar posse de sua própria história e aprendizados. Fazer a pergunta sobre o que aprendi na vida é uma oportunidade de grande reflexão. Podemos nos perguntar: qual a grande lição que a vida me trouxe? Ou será que foram muitas lições? Será que consegui aprender de fato, ou ainda estou no processo de fortalecer o aprendizado? O que a vida me ensinou? Com certeza vários foram os conhecimentos adquiridos durante a vida, mas as lições nascem muitas vezes de erros cometidos. Quando reconhecemos os erros e até falamos sobre eles, nos libertamos deles e podemos ajudar outros a enfrentarem erros semelhantes. Nesse momento, eu e minha história tornam-se fontes de inspiração para outras pessoas. Entender a essência do aprendizado de outra pessoa nos permite usar o mesmo ensinamento em nossa vida. A ferramenta para aprender com o aprendizado de outra pessoa é a arte: o teatro, a poesia, a escrita criativa, a atuação artística. Quando escuto o que outro ser humano aprendeu na vida, adquiro esperança de eu também conseguir ultrapassar dificuldades semelhantes e me esforço para ir além dos obstáculos da vida. Posso entender que também meus obstáculos podem ser oportunidades para que eu possa crescer além deles. O medo ou receio dos obstáculos podem se transformar em força para ultrapassá-los. Deepak Ramola não só coleciona lições de vida, mas as transforma em exercícios de reflexão e inspiração para que a vida de outros possa ser mais fácil de ser vivida, pois, afinal, somos todos humanos e, como diz Sri Krshna na Bhagavadgita 3.11 – Parasparam bhavayantah shreyah param avapsyatha. Nutrindo uns aos outros, que você alcance o mais alto bem – a liberação final. Om tat sat. Gloria Arieira YouTube: Deepak Ramola ou Project FUEL Instagram: @deepakramola Site: projectfuel.in #DeepakRamola #ProjetoFUEL #GloriaArieira #Lifeskillworkshops

  • A importância dos vários nomes de Ishvara

    O Mahabharata é uma história completa e complexa da vida humana. É dito que o que não aparece no Mahabharata não existe. A ideia é que tudo que se pode imaginar, fabricado pela mente humana, pode ser encontrado ali. No Mahabharata, são descritos vários personagens e suas escolhas – boas ou ruins – que nos servem como instrumento de reflexão e aprendizado. Encontramos detalhes significativos de suas escolhas e as consequências dessas. No meio desse épico, que contém 18 capítulos e 100.000 versos, há uma grande guerra e, após essa, uma reorganização na ordem da sociedade. Sabemos que o Mahabharata foi escrito por Shri Veda Vyasa, sendo contado por este para Vaishampayana; este último conta para Janamejaya, filho de Parikshit que era o neto de Arjuna. Ugrashravas escutou o diálogo entre Vaishampayana e Janamejaya e contou para um grupo de rishis que estava fazendo um grande ritual com duração de alguns anos. É dito que Ugrashravas foi visitar os rishis durante os anos de execução do ritual, e o líder dos rishis, Shaunaka, pediu a ele que lhes contasse algo interessante e útil visto ou ouvido por ele em suas viagens. Ugrashravas lhes conta sobre um maravilhoso diálogo que houve entre o rei Yudhishthira e seu avô Bhishma, que estava no leito de morte, depois da guerra em Kurukshetra. Yudhishthira pergunta sobre o dharma, que é belamente explicado por Bhishma, incluindo o dharma de um rei. Como parte desse discurso, o avô Bhishma ensina o Vishnu-sahasra-nama-stotram, versos que contém os 1.000 nomes de Vishnu. Bhishma esperava, no campo de batalha, a hora auspiciosa para deixar seu corpo. Parecia esperar pelo fim da guerra, que durou 18 dias, quando teria a oportunidade de dar seu último ensinamento para o rei Yudhishthira. Bhishma ensina a Yudhishthira que os mil nomes de Vishnu devem ser cantados para a libertação do sofrimento da vida diária e para a liberação final, caracterizada por completa ananda, plenitude, livre do medo, devido ao entendimento da realidade única, Brahman. Ishvara é nimitta-karana – a causa inteligente e upadana-karana – a causa material da criação. Ele tem que ser entendido, pois é tudo que existe, e inclui evidentemente cada indivíduo – como você e eu. Por isso Ishvara é chamado de Vishnu = aquele que tudo permeia, aquele que é tudo o que existe. Ishvara é o criador, nimitta-karana; mas quando se faz um ritual ou um oferecimento a Ishvara, ele é visto numa forma específica, apesar de todas as formas serem seu corpo, sendo a causa material de todo o universo, upadana-karana. Mas a verdade é que não há nada além de Ishvara, e qualquer forma em que ele é visto é um símbolo do todo que é ele. Todas as formas, sejam de devas ou devis, são formas de Ishvara. Todos os elogios e as grandezas especiais são dele. Para melhor cantar seus nomes, estes devem ser compreendidos para que sejam mesmo um elogio ou uma verdadeira declaração de amor. Se assim não for, perde a força, pois quem canta não sabe o significado do que está a cantar. Como o elogio que fazemos a alguém sem saber o que estamos a dizer. Cantar os nomes ou as qualidades de Ishvara exige que entendamos o que está sendo dito, fortalecendo assim o entendimento de nossa relação com ele, nos lembrando sempre que ele é parte intrínseca de nossa vida. Assim, Bhishma ensina a Yudhishthira os mil nomes de Vishnu para que todos possam cantar – sejam os 1.000 nomes, 108, ou apenas 18, ou mesmo um único nome na forma de japa. Cada um dos nomes conduz a pessoa que canta a meditar em Ishvara e a entendê-lo melhor. Cito alguns nomes aqui. O primeiro é Vishvam – aquele que pode ser visto na forma de todo o universo. A seguir, Vishnuh – aquele que tudo permeia, aquele que é a verdade de tudo. Mais adiante encontramos: Darpaha – Ishvara é aquele que destrói o orgulho e a vaidade, ao destruir o que leva a pessoa a ser orgulhosa ou vaidosa. E, a seguir, Darpadah – é aquele que dá o orgulho apropriado, pois as qualidades das quais alguém se orgulha foram adquiridas com seu próprio esforço e o resultado correspondente. Pois a autoconfiança é importante e produz a força para ultrapassar obstáculos. Por fim, encontramos o nome Anantarupah – aquele de formas incontáveis pois todo o universo é sua forma. E Amurtiman – aquele que não possui forma alguma, sendo essa sua verdadeira natureza, nirguna-brahman. Em qualquer namavali (naama aavalii – sequência de nomes) para Ishvara, encontramos nomes que são aparentemente contraditórios e ajudam a entender a natureza de Ishvara que é causa inteligente e material ao mesmo tempo, que é sem forma mas de quem todas as formas dependem, que é imanente a tudo e livre de tudo. Um desses nomes, que aparece na lista dos 108 nomes de Sri Krshna, é um reconhecimento, um elogio e ao mesmo tempo uma declaração de entendimento dele: sat-cit-ananda-vigrahah – aquele cuja forma é uma decoração de sat, cit, ananda. O Vishnu-sahasra-nama-stotram, que declara os mil nomes de Vishnu, é ensinado por Bhishma Pitamaha, em forma de versos contendo os nomes seguidos um do outro, somando mil nomes. Desses versos, cada nome é separado e colocado no 4º caso, significando “para”, e seguido da palavra “namah”, que significa saudações. Nesse outro formato é chamado de Vishnu-sahasra-nama-avalih – A sequência dos 1.000 nomes de Vishnu. Como, por exemplo, acontece com o nome Vishnuh que se torna vishnave namah = Saudações para Brahman.. Todos os nomes referenciam as várias formas dos devas e devis, que são Ishvara, que é a verdade imutável e essencial de tudo o que existe, Brahman. Sempre, em qualquer canto ou mantra repetido, qualquer que seja a forma pensada ou invocada, a oração vai para Ishvara, Parameshvara. Ao cantar os vários nomes, ele é lembrado e a mente de quem canta com reverência vai para Ishvara e, nesse momento, os dois são reconhecidos como um somente – um momento de samadhi, jnana-samadhi, um momento em que a dualidade desaparece ao dar lugar à apreciação do um, um samadhi de conhecimento. Om tat sat Gloria Arieira #Mahabharata #Yudhishthira #Bhishma #Brahman #Vishnuh #Ishvara #namavali #naamaaavalii #samadhi #stotram #GloriaArieira #Vedanta #tradiçãovédica #vedas

  • Prêmio Padma Shri 2020

    Vidya Mandir tem o orgulho de anunciar que Gloria Arieira foi agraciada com uma das maiores honras civis da Índia, o Padma Shri Award, no Dia da República de 2020, por sua literatura e educação em sânscrito e Vedanta no Brasil. Gloria Arieira Janeiro 2020 Sadashivasamarambham shankaracaryamadhyamam Asmadacaryaparyantam vande guruparamparam. Por ocasião da premiação do Padma Shri 2020 oferecida pelo governo da Índia, eu gostaria de fazer uma oração: Que eu, e todos nós, sejamos abençoados para sermos tulya-ninda-stutih (uma pessoa que tem a mente tranquila quando criticada ou elogiada) e vidya-vinaya-sampannah (uma pessoa possuidora de conhecimento e humildade), com as bênçãos dos ensinamentos de bhagavan Shri Krshna através da Bhagavadgita. Estou muito honrada e ao mesmo tempo surpresa por ter sido apontada para o prêmio Padma Shri 2020. É um prêmio muito importante e significativo oferecido pelo governo da Índia. Ofereço esse prêmio aos meus mestres – Sri Swami Dayananda-ji e Sri Swami Chinmayananda-ji. Todos os dois foram significativos para mim. Sem qualquer um dos dois, eu não estaria hoje aqui, a fazer o trabalho que fiz, que estou fazendo. Swami Chinmayananda-ji me aceitou e me acolheu desde a primeira vez que o conheci no Brasil e depois quando eu cheguei na Índia em 1974. Apesar de eu ser muito jovem e ocidental, não sabendo nada sobre Índia nem sobre Vaidikadharma (o conhecimento e a cultura dos Vedas), ele me recebeu alegremente na Índia e permitiu que eu fizesse parte do curso que estava a acontecer em Sandeepany Sadhanalaya, Mumbai. Ele me ensinou a focar naquilo que era mais importante para mim e aguentar o que era secundário, se fosse necessário. Ele me ensinou que as pessoas basicamente criticam os outros, mas que é assim mesmo. As adversidades nos fortalecem e nos ajudam a definir nossas prioridades e a nos esforçarmos para conquistá-las. Em todo meu percurso ele me ofereceu seu suporte e confiou que eu teria sucesso. Swami Dayananda-ji me ensinou tudo o que sei de Vedanta e Vaidikadharma, os ensinamentos mais preciosos sobre Ishvara, sobre o relacionamento básico que temos com Ishvara, e o fato de que carregamos esse relacionamento para todos os outros relacionamentos. Swamiji me ensinou que o Veda é um pramanam, um meio de conhecimento específico, e que, assim sendo, pertence a todas as pessoas independente de sua origem. Ele me ensinou Satyam Brahman (que existe uma realidade única livre de limitação), mas também me fez entender que é muito fácil entender Brahman, a dificuldade está em entender Ishvara e trazê-lo para nossa vida diária, o que faz toda a diferença. Swamiji também me fez apreciar, entender e amar o grande mestre Sri Shankara e seus comentários aos textos estudados em Vedanta. Esses meus três gurus estão diariamente comigo, em minha mente e meu coração. Devo a eles tudo o que sei, tudo o que sou hoje. Inspirada por eles fiz todo esse trabalho de ensinar e manter viva a cultura da Índia no Brasil por 41 anos. Mas tudo que aprendi na Índia não seria suficiente se não fosse por meus três filhos e agora também minhas noras, genro e meus netos. Com eles aprendi a ser humana e aceitar minha humanidade, aceitar a pessoa que sou com todas as limitações e grandezas. Aprendi a apreciar a beleza do universo que é Ishvara. Meus pais, família e alunos foram também muito importantes ao longo desses anos. O prêmio vai para meus gurus, meus filhos, pais, família e alunos ao longo desses anos, no Brasil e em Portugal. Vai também para meus colegas que estudaram comigo na Índia. Nós, como alunos dos mesmos mestres, recebemos as mesmas bênçãos de nossa sampradaya, nossa tradição de ensino. Somos todos abençoados pelos ensinamentos e pelos mestres. Como não nasci na Índia, na tradição dos Vedas, posso parecer especial, mas o que tenho feito não é diferente do que tem sido feito por muitos em nossa tradição. O prêmio pertence a todos nós dessa tradição de ensinamento. Por ter vindo de outro país para estudar Vedanta e Sânscrito na Índia, num ashram tradicional e com professores tradicionais, minha vida diária lá foi muitas vezes bem difícil. Tive apoio especial de alguns colegas a quem sou muito grata, são eles: minha querida amiga K. Chandra e sua família, Chandramouli-ji, Swami Paramarthananda-ji, Swami Brahmatmananda-ji and Ramasamy. Esses, e alguns outros, aceitaram o fato de que eu era ocidental e os erros cometidos por mim devido à minha ignorância. Eles não me criticaram, mas me ajudaram e apoiaram sempre. Eles fizeram grande diferença em minha vida na Índia e em minhas conquistas. Assim sendo, esse prêmio vai para muitas pessoas que estão dentro de mim; cada uma merece o prêmio Padma Shri. Agradeço a cada um. Harih om, Gloria Arieira Ver mais Padma Awards Ministério de Assuntos Internos (Governo da Índia) Gloria Arieira dedica Padma Sri ao Shankara Sampradaya por Aparna Sridhar - 4 de Fevereiro de 2020 Assista a notícia sobre o prêmio Padma-Shrii em Doordarshan - DD News, uma emissora autônoma de serviço público fundada pelo governo da Índia (a partir de 9:09) Leia a tradução da notícia sobre o prêmio Padma-Shrii em Doordarshan - DD News Tradução do Professor Henrique Castro [Aishamo varshe padmapuraskaareSu saptapadmavibhushanaani SoDashapadmabhushanaani aSTadashottara-ekashatapadmashiiH iti bhuuSitaaH.] [Este ano nas premiações Padma, foram homenageadas 7 pessoas com o premio PadmaVibhushana, 16 com o premio PadmaBhushana e 118 com o premio Padmashrii.] पद्मश्रीःपुरस्कार-सूच्याम् एका विशिष्टा वैदेशिक-महिला अपि समाविशति । Entrou na lista do prêmio Padma-Shrii uma distinta mulher estrangeira. इयं हि ब्राजील-देशीया [vartate], रियो-डि-जेनेरो-नगर-वास्तव्या ग्लोरिया आरियेरा । Ela é a brasileira, moradora da cidade do Rio de Janeiro, Gloria Arieira. ​ ( सा हि ) अस्मिन् वर्षे साहित्य शिक्षा क्षेत्राय पद्मश्रीःसम्मानेन सभाजयिष्यते। Ela será homenageada esse ano com a premiação Padmashri no campo de literatura e educação. ​ संस्कृत-साधिका ग्लोरिया आरियेरा ब्राजील-देशे विद्या-मन्दिरमपि संस्थापितवती [vartate]। Estudiosa do Sânscrito, Gloria Arieira estabeleceu no Brasil o Centro de Estudos Vidya Mandir. ​ तत्र च अनया वेदान्तस्य प्रचारो विधीयते। E nesse local o ensino de Vedanta é realizado por ela. ​ ग्लोरिया आरियेरा चतुस्सप्तति-उत्तर-एकोन-विंशति-शत-तमे वर्षे स्वामिनः चिन्मयानन्दस्य निमन्त्रणम् अधिकृत्य भारतम् आगता आसीत्। Gloria Arieira chegou à Índia no ano de 1974 seguindo o convite de Swami Chinmayananda. [Anayaa bhuri-samskRtagranthaaH anuditaaH santi] [(Atualmente) por ela muitos textos em sânscrito já foram traduzidos.] ​ अमुना स्वामिन: दयानन्दसरस्वतीवर्यस्य सान्निध्ये वेदान्तादिशास्त्राणां गहनाध्ययनं कृतम्। O estudo profundo de Vedanta e outros temas relacionados foi concluído por ela sob orientação direta do grande Swami Dayananda Saraswati. ग्लोरिया आरिएरा वर्यया चतुस्सप्तत्युत्तर-एकोनविंशति-शत-तमाद् वर्षात् ब्राजीलदेशे, नवोत्तर-द्विसहस्र-तमवर्षात् च पुर्तगाले संस्कृतग्रन्थानां व्यापकशिक्षणं कारितमस्ति। Por meio dessa grande professora Gloria Arieira o ensino dos textos de Vedanta em Sânscrito tem sido propagado desde 1979 no Brasil e desde 2009 também em Portugal. #SwamiDayananda #SwamiChinmayananda #GloriaArieira #India #SwamiBrahmatmananda #Ramasamy #Premiação #PadmaShri #Ishvara #Shankara #Vaidikadharma #Brahman #Bhagavadgita

  • Revisitando Ranachatti

    Gloria Arieira Novembro 2019 Em 2010, fui com um grupo de peregrinos brasileiros, meus alunos, a Yamunotri, um dos quatro famosos centros de peregrinação nos Himalayas. Tínhamos a intensão de irmos imediatamente depois para Kedarnath, outro desses quatros centros. Já tínhamos ido aos outros dois em 2007 – Gangotri, incluindo Gomukh, e Badrinath – e a peregrinação foi um sucesso em todos os sentidos. Esses quatro lugares conjuntamente são chamados de Chardham (char = quatro; dham = lugar de peregrinação) e uma visita a eles era enfatizada por Sri Swami Tapovan, que pediu que Swami Chinmayananda fosse aos Chardham antes de iniciar seus estudos de Vedanta em Uttarkashi com seu mestre. Ao sairmos de Yamunotri ficamos isolados em Ranachatti, a 5 km de Yamunotri. Não foi fácil. Primeiro porque não pretendíamos ir para lá, muito menos ficar ali por uma semana. Então, nos sentimos isolados, necessitando de resgate. E este não chegava. Mas poderíamos facilmente termos decidido nos isolar em Ranachatti para estudar Vedanta e meditar. Seria o lugar perfeito – uma vila pequena no coração dos Himalayas na beira do rio Yamuná. Poderíamos ter chamado essa semana de “Semana de Vedanta na India 2010”, pois tivemos aulas, meditação, palestras, satsangas, pujas, ásanas e cânticos védicos. Porém não escolhemos nos isolar para uma semana de estudos e meditação, fomos isolados pelo destino e não conseguimos aproveitar nosso destino. Definitivamente há diferença entre se isolar e ser isolado. O lugar é lindo, mas queríamos ir para outro lugar e não estávamos conseguindo. Diz a Upanishad: Manah eva manushyanam bandha-mokshayoh karanam. A mente somente é a causa do aprisionamento e da liberação para os seres humanos. São quase dez anos desse evento. Houveram revoltas, conflitos, insatisfações e desapontamentos por parte do grupo. Tentamos evitar o conflito, mas as situações difíceis foram inevitáveis e não conseguimos passar pela experiência sem alguns estresses. E o grupo de peregrinação acabou ali. Tentamos nos organizar mais uma vez, em 2013, para irmos juntos a Kedarnath, mas mais uma vez as chuvas não nos permitiram. Dessa vez nem saímos do Brasil. Tenho certeza que todos do grupo revisitaram Ranachatti inúmeras vezes em suas mentes. A localização da vila é admirável; o hotel bastante simples, assim como a comida, mas estávamos seguros e fizemos três refeições deliciosas diariamente. Até encontramos uma pequena super-loja com todo tipo de necessidades e amenidades. Tínhamos vindo do sul da Índia, onde tivemos um encontro com o Swami Paramarthananda-ji que nos disse que o maior inimigo para a mente calma é o medo – o medo do futuro e o medo de não conseguir que a vida seja conforme desejamos, de não conseguirmos controlar cada detalhe da vida para ser feliz. Em Ranachatti tivemos que refletir sobre tyaga, o desapego; sobre o medo, bhaya; e sobre a limitação, com a presença forte de Shani, o Saturno, pois é em Ranachatti onde há seu templo. Tivemos que exercitar o desapegar-se. Tivemos que largar o querer controlar nossa vida, pois não tinha o que fazer para mudar as circunstâncias dia após dia. Somente Ishvara, a Ordem cósmica, estava no poder. Isto era muito claro. Tivemos que largar nossos padrões de como deve ser a cama, o banheiro, o banho diário, o conforto em geral. Tivemos também que deixar para trás muitos de nossos pertences na hora da saída, pois o helicóptero de resgate permitia somente uma mochila para cada um. Assim, fomos levados a abandonar a importância pessoal criada pelo poder do dinheiro e posição de poder, pois esses serviam de quase nada. E muitos tiveram medo – da morte, do futuro, de acabar a comida, de não ter força, de ser rejeitado, de desentendimentos, enfim, de que tudo desse errado. E ali estava a presença constante de Saturno, aquele que traz a limitação para que possamos ir além dela; aquele que ceifa, que tira as gorduras e deixa só o essencial, a estrutura básica de pé. Saturno das disciplinas, de “aguentar firme”, da peregrinação e do ascetismo. A bênção de Shani vem na forma de dificuldades, disciplinas, perdas, mas por detrás de tudo isso tem sempre as lições aprendidas e a consequente maturidade. Shani protege o dharma e dá o resultado adequado de nossas ações. Yama, deus da morte, é seu irmão; Yamuná é sua irmã. Nossos dias foram com total ausência de confortos físicos de toda espécie. Ali visitamos dois templos de Saturno, o antigo e o novo. Sim, houve limitação e desconforto em Ranachatti, mas também fomos bem recebidos, comemos e dormimos protegidos e, por fim, fomos resgatados para a cidade. Quando Hanuman-ji chega pela primeira vez em Lanka, ele encontra a guardiã do portão da cidade. Ela proíbe a entrada de Hanuman, mesmo quando ele diz que somente queria ver a cidade pois muitos falavam sobre suas belezas. A guardiã do portão insiste que ele não poderia entrar, e Hanuman luta com ela e a domina. Imediatamente a guardiã de Lanka se lembra da profecia de que quando um macaco aparecesse e a derrotasse seria o sinal de um novo tempo, o reino de Ravana seria destruído completamente em breve. Ela, então, abandona seu posto de guardiã e decide ir embora. Esse evento marca uma mudança, o início de um novo momento. Penso que os dias em Ranachatti também mudaram nossas vidas. Todos nós tivemos que encarar nossas limitações, apegos, medos e inseguranças, assim como nossas certezas e visões iludidas sobre tantas coisas. Repensamos muitos assuntos. Tivemos que nos re-organizar individualmente e enquanto grupo. Tentamos manter o grupo, que em Delhi se dissipou, mas já estávamos diferentes, mais maduros, unidos de forma diferente, pela experiência que passamos juntos. Cada um teve que pensar sobre o que é importante para si, o que quer e não quer deixar cair. Muitas coisas mudaram na forma em que cada um iria peregrinar em sua vida a partir dali. Ranachatti é uma memória, um marco, uma reflexão sobre a vida, uma simples vila nos Himalayas. As reflexões levaram a mudanças que fortaleceram cada um. Cada momento é especial quando conseguimos olhar para ele como especial no momento em que ele ocorre, quando o acolhemos na ordem cósmica, com suas surpresas, sofrimentos com certeza, mas principalmente ganhos imensos. E o maior ganho vem de acolher cada novo fato quando este se apresenta, pois é nesse acolhimento que se mantém a liberdade interna. A liberdade de ser parte de uma ordem imensa, maior e mais complexa do que podemos imaginar, e estar em paz, sempre à vontade, sem querer que acabe para dar lugar ao próximo evento, mas aproveitando cada momento em paz consigo mesmo, na Ordem que é Ishvara. Preenchido, satisfeito, em paz a cada momento. Como poderia ter sido em Ranachatti em 2010. Delhi | Embaixada do Brasil após o resgate Om tat sat Gloria Arieira Yatra – A peregrinação Gloria Arieira Março 2012 Somos, ou talvez tenhamos sido, um grupo de peregrinação na Índia e planejamos visitar os Chardham, os 4 lugares de peregrinação no norte da Índia, nos Himalayas. Em 2007, visitamos Gangotri e Gomukh, a fonte do rio Ganga. Gangotri é dos 4 o mais visitado, estava cheio de gente e com alguns pingos de chuva. O templo ali é pequeno, branco, delicado na paisagem extraordinária. Mais adiante, com uma distância de algumas horas de caminhada difícil, com muitas pedras e altitude elevada, está Gomukh, uma abertura no gelo de onde nasce, é dito, o rio Ganga. Para ir a Gomukh tivemos que ultrapassar nossos limites físicos, nos submeter a limitações do corpo com relação a onde dormir, o que comer e muita caminhada. Houve muito desconforto físico e também muito silêncio. O próprio falar nos desgastava. Seria muito penoso reclamar. Cada um estava sozinho e experienciou belezas e também limitações consigo mesmo, compartilhando olhares e poucas palavras. Nos encantamos, ultrapassamos limites, fomos e voltamos sem a certeza do sucesso da integridade do corpo e suas forças até o final proposto. De Gangotri/Gomukh fomos para Badrinath. Lugar encantador, colorido, alegre. Nos hospedamos em um confortável hotel e comemos bem. Com calma e descansados visitamos o templo cheio de cores com as montanhas nevadas por trás. Nos unimos na visita ao templo, nos emocionamos com a presença do mestre Shankara em imagens e com as pujas e os pujaris do sul da Índia. Juntos choramos de emoção, nos abraçamos, andamos, ou melhor, passeamos pelos arredores. Com calma e alegria por tudo que vimos e sentimos, pela presença divina experienciada, deixamos leves este lugar de peregrinação com o coração transbordando. Em 2010 planejamos visitar os 2 outros Dhams, os lugares de peregrinação que nos faltavam – Yamunotri e Kedarnath. Tínhamos certeza que faríamos a visita aos 2, pois havíamos feito os outros 2 com sucesso em 2007. Algumas pessoas se juntaram ao grupo confiante. Para nossa surpresa chovia bastante no caminho de Yamunotri, mas estávamos determinados a ir, até porque estávamos convencidos que éramos um grupo abençoado, pelas evidentes bênçãos que tivemos em 2007; apesar das dificuldades, havíamos conseguido ir onde desejamos e planejamos. Mas Yamunotri é o lugar de mais difícil acesso dos 4 (Gomukh não é considerado um dos Chardhams e ali não há um templo construído). Como chovia sem parar nos últimos dias, a estrada estava difícil e havia pouca gente por ali. Com exceção de 1 pessoa do grupo, seguimos caminho, confiantes mas atentos. A caminhada é longa e difícil pela altitude, além disso, chovia. Chegamos ao templo cansados, mas como demoramos muito no caminho, não tínhamos muito tempo para permanecer ali, pois escurecia e tínhamos que descer novamente a pé os 14 quilômetros para pegar nosso ônibus e retornar ao acampamento onde deveríamos passar a noite. Fizemos nossas orações e reverências e descemos. Porém, a chuva, os deslizes de pedras, a escuridão da noite e o bloqueio da estrada com fios elétricos derrubados nos fizeram parar e procurar abrigo em algum lugar por ali. Ficamos numa vila chamada Ranachatti, no caminho entre Yamunotri e Bharkot onde ficava nosso acampamento, e ali, despreparados, tivemos que passar uma semana. Yamunotri é irmã de Yama, o deus Morte, e Shani, o planeta Saturno. Nessa peregrinação fomos obrigados a lidar com nossa mente – nossas expectativas, nossos medos, desejos, impaciências e intolerâncias, nossa arrogância e ansiedade. Cada um encontrou um meio para lidar com isso tudo, e não havia para onde fugir. Tivemos que encarar nossa mente, suas fraquezas e vulnerabilidades. Agora desejamos ir ao último Dham – Kedarnath, o lar do Senhor Shiva. O templo originalmente construído pelos Pandavas, depois da guerra em Kurukshetra, depois que haviam matado os primos, parentes, amigos, o avô e o mestre. Lugar para onde foram como prayascita-karma, para neutralizar o “papa” desta matança. E lugar onde os 5 tiveram que se purificar para poderem ter darsham, poderem ver o Senhor Shiva que se “escondia” deles. Mais humildes, planejamos essa peregrinação para 2013, desejando sermos merecedores de finalizarmos nosso vrata, nosso voto de visitarmos os 4 Dhams. Reconhecendo que não depende somente de nós, de nossa determinação, nossa força de vontade e nossos recursos. Depende principalmente de daivam, o terceiro fator que não está sob nosso controle. Teremos o orgulho de termos ido aos 3 Dhams, mas sabemos que a vaidade de que tudo podemos não tem espaço. Om namah Shivaya Gloria Arieira A Índia devocional Gloria Arieira Maio 2011 Nas minhas viagens para a Índia, minha turma preferida sempre foram os brahmanas do sul da Índia incluindo os pandits e pujaris, oficiantes dos templos do sul da Índia. O sul e os sulistas são minha primeira preferência. Em 2007 fomos aos primeiros 2 dhams, Gangotri, incluindo Gomukh, e Badrinath. No templo de Badrinath os oficiantes também são do sul, de Kerala. Em 2010, planejamos Yamunotri e Kedarnath, mas fomos mesmo a Yamunotri e Ranachatti, que não é exatamente um dham, um centro de peregrinação importante dos Himalayas, mas definitivamente um lugar importante. Lá visitamos o templo de Shani, que é o Saturno, filho do Sol. E tivemos bastante contato com o oficiante dos rituais do templo de Saturno, cuja família cuida do templo de Yamunotri. Apesar de minha intimidade com os brahmanas oficiantes do sul da Índia, os do norte parecem ser outra classe, bem diferentes. Uma das questões que faz a diferença é que o sul é quente sempre. Nos templos, os homens usam dhoti branco, bem lavado, o peito nu somente coberto com um pano, o upavastram. E só vão ao templo depois de tomar banho. No norte é frio durante grande parte do tempo. Usam casacos que não são regularmente lavados.Não se pode usar água em abundância, pois os utensílios e os altares não secam. E os cantos védicos, em sânscrito, tem pronúncia diferente e entonação levemente diferente também. Nosso pujari e oficiante de Ranachatti chama-se Pandit Jyoti Prasad Uniyal. Ele cuida do templo de Shani que fica bem no alto da vila. Tem o templo antigo e o novo que ainda não está completamente terminado. Como ele é dono de um hotel na rua principal, ele fez, no último andar do hotel, um templo simples com lugar para palestras; lá ele nos recebeu e fez uma puja e uma palestra que foi traduzida por nosso guia, Ganesh Lal Sharma, brahmana do norte também. Nós cantamos também alguns versos em sânscrito e recebemos um cordão no pulso para abençoar nossa viagem de retorno. Pandit Jyoti Prasad Uniyal tem, neste pequeno templo da rua principal, muitos quadros e fotos de eventos devocionais organizados por ele e fotos de outros eventos em que ele participou. São yajnas especias com muitos oficiantes de várias cidades da Índia e com duração de muitos dias. Foi muito interessante este contado, assim como também com Sri Sarvesh, o gerente do Banco Punjab National Bank que nos contou muitas coisas sobre a vila e a vida na área. Mais uma vez, é a Índia devocional e protetora do conhecimento dos Vedas que me encanta. Om tat sat Gloria Arieira O dia a dia em Ranachatti Gloria Arieira Fevereiro 2011 Depois do segundo dia em Ranachatti, percebemos que ficaríamos naquela vila mais do que havíamos imaginado. Fomos então organizando um programa especial, como se estivéssemos num ashram, num retiro espiritual nos Himalayas. O programa era de acordar cedo e tomarmos café da manhã no restaurante do outro lado da rua de nosso hotel e depois começarmos as atividades até o fim do dia, quando estava escuro e, não havendo energia elétrica devido às chuvas, jantávamos, fazíamos um satsanga e íamos nos deitar. Durante o dia, cantamos muitos versos e mantras que conhecemos e com a ajuda de alguns livros de Cânticos e Versos do Vidya Mandir que estavam nas mochilas de alguns. Fizemos aulas de Vedanta com foco em alguns capítulos da Bhagavadgita, aulas de simbolismo védico, palestras sobre a mente, astrologia, aulas de yoga. Também fizemos passeios a pé pela redondeza e satsangas, além dos bate-papos informais diários e discussões sobre planos de ação para nossa partida. Houveram também ida às compras e passeios com fotos; visitas ao templo e palestras do pujari e do gerente do único banco, acho que era o Bank of Punjab. Este último nos informou sobre a natureza da vila, como ela nasceu e a origem das pessoas que lá viviam. Disse, para nosso relaxamento, que as pessoas daquela vila eram honestas e devotas do templo principal, o templo de Shani, o Saturno. A vila valoriza conhecimento e as crianças se arrumam todas para irem à escola diariamente. São 3 escolas para a vila. A maior produção da vila é batata pequena, bem gostosa. As pessoas nos receberam bem e por meio de nosso guia, Ganesh lal Sharma, pudemos nos comunicar, ficar lá o tempo necessário e sair com segurança. Om namah Shivaya Gloria Arieira #Yamunotri #Himalayas #Kedarnath #Gangotri #Gomukh #Badrinath #Chardham #SriSwamiTapovan #SwamiChinmayananda #Meditação #Palestras #Satsangas #Pujas #Ásanas #CânticosVédicos #Vedanta #Peregrinação #Tyaga #Desapego #Bhaya #Medo #Limitação #Shani #Saturno #Templo #Ishvara #Dharma #Yama #Yamuná #Hanuman #Bhagavadgita #Yoga #Ganga #Ranachatti #Brahmana #Dham #Kurukshetra #Shiva #Pandavas

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